Crítica: Aporia (2023)

aporia – subst.
apo·​ria ə-ˈpȯr-ē-ə
signif. uma contradição interna ou disjunção lógica insolucionável dentro de um texto, argumento ou teoria.

A ficção-científica de grande escopo geralmente negligencia o lado humano de determinada questão, o que acaba sendo um problema, porque no final das contas, são os humanos quem determinam como a ciência é utilizada. Esta esperta produção independente dirigida por Jared Moshé (do western intimista A Vingança de Lefty Brown), foca na experiência humana e na profunda necessidade que conduz nosso envolvimento com a tecnologia, seu desenvolvimento e seu potencial destrutivo.

No coração da história está Sophie (Judy Greer, de Halloween Kills: O Terror Continua), que está no fundo do poço quando a vemos pela primeira vez. Seis meses atrás ela perdeu o marido, Mal (Edi Gathegi, da série StartUp), sua filha, Riley (Faithe Herman) está devastada, e não quer saber da mãe. Sophie está lutando contra o luto, o que afeta seu trabalho e até a compaixão das pessoas ao seu redor. Seu amigo, Jabir (Payman Maadi), é o único que está sempre ao seu lado, e ambos compartilham de uma relação de verdadeira confiança um no outro. A confiança é tanta, que ele decide mostrar a ela a máquina na qual ele e Mal estavam trabalhando antes dele morrer; um emaranhado de fios e peças soltas que não pode ser chamada exatamente de máquina do tempo. A máquina pode fazer apenas uma coisa: acelerar partículas abstratas em um local específico no espaço-tempo. Como Sophie não é uma física (e nem nós), Jabir explica a ela em termos leigos: a máquina é capaz de disparar uma bala em direção ao passado.

Judy Greer e Edi Gathegi em APORIA (2023)

Você mataria um estranho para salvar alguém que você ama? Sophie sabe que o motorista bêbado responsável pela morte de Mal não tinha a intenção de matá-lo, e por um tempo ela luta internamente, seguindo o homem por aí, tentando persuadir a si mesma de que ele não merece viver. No final das contas, contudo, ela simplesmente coloca seu desconforto moral de lado. Talvez por um lado ajude o fato de que ela não acredita totalmente no que Jabir está lhe contando – pelo menos até ela ir buscar Riley no parque e encontrar Mal, vivinho da silva, no local.

É impossível não contar a ele, é claro. Ela simplesmente não consegue suprimir tamanha emoção – e nem haveria tal necessidade, já que ele ajudou Jabir a desenvolver a máquina, afinal de contas. A porção central do filme então lida com o que exatamente os três personagens farão a partir deste ponto. Jabir, que possui uma razão profundamente pessoal para trabalhar na máquina, quer usá-la para combater terroristas. Sophie está atormentada pelas implicações morais em torno da utilização do artefato, mas seu foco primordial é tentar aliviar sua própria culpa, procurando algum meio de ajudar a família do homem que ela matou – o que se mostra algo desafiador quando, no processo, ela fica sabendo mais sobre ele e é forçada a reconhecer sua humanidade. Mal, enquanto isso, flerta com a ideia de publicar sua descoberta – o que, se você pensar um segundo sobre isso, pode desencadear aterrorizantes implicações.

A ciência é bem trabalhada no filme, e mantida num patamar simples. A abordagem bastante realista de Moshé pode até remeter ao cult Primer (2004), filme que ele reconheceu ser uma influência. Tudo aqui é trabalhado em pequena escala, quase mundana, apesar do massivo elemento da tecnologia. As diferenças nas perspectivas dos personagens são bem exploradas pelo plot, e ao mesmo tempo, Aporia (EUA, 2023, 104 min.) explora as diferentes maneiras com que as pessoas processam o luto.

As performances de todo o elenco impressionam. Gathegi e Greer (particularmente uma atriz que que gosto muito), possuem uma química que torna a profundidade de seus laços algo totalmente crível, mesmo quando Mal está distraído por sua paixão por conhecimento. É o contraste entre as performances de Greer e Maadi o que realmente move o filme adiante, entretanto. Sophie é consumida por seu luto, que explode dentro dela e se infiltra em tudo, e aqueles espectadores que possam estar lidando com tal condição vão se sentir bastante afetados por isso. Jabir, no entanto, carrega um terrível fardo com dignidade silenciosa, focando em encontrar soluções ou formas de compensação para suas ações ao longo do caminho.

Não existem vilões aqui, apesar de sentirmos suas sombras pairando nas beiradas da história. Tudo é construído sobre a contradição do esforço para reivindicar ou preservar a vida, quando tudo o que o indivíduo pode fazer é matar. Além deste ponto, erros são cometidos, e aceitar as consequências se prova algo cada vez mais difícil. Cada personagem luta de uma maneira diferente com seus pólos morais cada vez mais instáveis. Mesmo sem o elemento do tempo, toda a situação exposta em Aporia seria um enigma multidimensional, onde o desafio é encontrar uma solução possível.

Avaliação: 3 de 5.

Aporia ainda não possui informação de chegada em território brasileiro. A informação deve ser atualizada em breve.

O Trailer Oficial de APORIA (2023)

5 comentários sobre “Crítica: Aporia (2023)

  1. O filme é bom. É daqueles que quando acaba vc vem pesquisar sobre o que poderia ser seu final… e não encontra. Ele tem um tema bastante interessante, que se repete, mas que sempre parece ser diferente. Quem não tem a curiosidade sobre a possibilidade?

    Curtido por 1 pessoa

  2. O filme é bom. É daqueles que quando acaba vc vem pesquisar sobre o que poderia ser seu final… e não encontra. Ele tem um tema bastante interessante, que se repete, mas que sempre parece ser diferente. Quem não tem a curiosidade sobre a possibilidade?

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