Crítica: Black Mirror | S03E01 – Nosedive (Queda Livre) | 2016

Produzida pela emissora britânica Channel Four em 2011, a série Black Mirror inovou o gênero da Ficção-Científica, ao abordar a tecnologia cotidiana de maneira original e um tanto dark, situando-a em cenários criativos e provocativos, onde a imaginação é o limite. O tom crítico da série, transformou-a em uma verdadeira alegoria para discutir o uso e o abuso da tecnologia na sociedade contemporânea (vide o uso cada vez mais constante de aparelhos celulares, da informática, e outras vertentes tecnológicas espalhadas por aí).

Após duas temporadas de apenas três episódios cada uma, além de um episódio especial, Black Mirror vinha de um longo hiato desde a exibição de seu último episódio, em fevereiro de 2013. O episódio adicional, conhecido como “Especial de Natal” ou ‘White Christmas’, foi exibido apenas em dezembro de 2014. Em 2016, os direitos da série foram adquiridos pela gigante Netflix, que em outubro do mesmo ano, disponibilizou de uma só vez seis novos episódios que formam a terceira temporada da série, com certeza a mais aguardada pelos fãs. E apesar da série com certeza se “americanizar” um pouco com a aquisição da Netflix, seu núcleo continuou intacto, já que seu criador e roteirista, o britânico Charlie Brooker, continua até hoje com as rédeas da série.

Bryce Dallas Howard em Black Mirror | S03E01 – Nosedive (Queda Livre) | 2016

E o primeiro episódio da terceira temporada, Nosedive (Queda Livre), traduz muito bem esta transição de Black Mirror para a Netflix, já que o episódio é ambientado em terras norte-americanas, apresenta de maneira nítida um orçamento bem maior na composição do episódio, e carrega um tom bem mais leve do que o público se acostumou a ver na fase britânica da série. Ainda assim, a grande qualidade da série – a acidez crítica ao abordar a tecnologia cotidiana, continua firme e forte na narrativa do episódio.

Nosedive apresenta ao público de Black Mirror um futuro distópico e aparentemente perfeito, onde o status social de seus habitantes dita as regras de quem sobe e quem desce na pirâmide econômica. Tal status social, é edificado e medido através de um ranking, onde o indivíduo é avaliado a cada postagem e interação em redes sociais. Neste cenário está a bela Lacie (a estonteante ruiva Bryce Dallas Howard, de Jurassic World e A Vila), uma jovem que está obcecada em chegar ao topo da pirâmide, e passar a viver uma vida utópica ao lado de pessoas ricas, bonitas e supostamente perfeitas. Tal chance surge quando Lacie é convidada por sua abastada amiga de infância, Naomie (Alice Eve, de Before We Go), ela própria uma das ocupantes de um lugar no topo da classificação, para ser sua madrinha de casamento, em uma badalada cerimônia que será realizada na alta sociedade. Mas quando Lacie embarca para a viagem rumo à cerimônia, as coisas não saem exatamente como Lacie imaginou.

Dirigido pelo competente Joe Wright (de Orgulho & Preconceito e Desejo e Reparação), Nosedive é visualmente encantador. A concepção visual do episódio é de encher os olhos, misturando no ambiente elementos do cotidiano, com vertentes tecnológicas mega-avançadas, honrando o propósito da série. Entretanto, apesar da ótima ideia do criador da série Charlie Brooker, o roteiro do episódio, à cargo da também atriz Rashida Jones (The Office, Silo), e Michael Schur (criador de séries como Brooklyn 99 e Parks and Recreation), carrega um tom um tanto histriônico demais, que se traduz na interpretação absolutamente irritante da bela Bryce Dallas Howard, que apesar de boa atriz, não acerta a construção de sua personagem. Existe, é claro, uma diretriz proposital para a personagem ser como é, entretanto, tal diretriz não elimina a irritabilidade por parte do espectador, que literalmente se contorce a cada gargalhada ou grito forçado por parte da protagonista.

O episódio acaba se justificando mesmo graças à sua bem-vinda ideia geral, que utiliza as redes sociais e suas funções “curtir” “amei”, etc… como termômetro para medir e formar indivíduos falhos e egocêntricos, que praticamente vivem em função da aceitação em massa de seu status em qualquer rede social. É interessante também a maneira com que o episódio trabalha uma possível “libertação” deste círculo vicioso, em sua provocativa (mas não menos estridente) sequência final.

Resumindo, Nosedive é uma boa abertura de terceira temporada para Black Mirror. Um episódio que traz alguns deslizes em sua concepção, mas que honra a tradição high-tech da série, sem deixar de ser contundente em suas alfinetadas ao way of life cada vez mais deturpado da sociedade atual.

Avaliação: 3.5 de 5.

Nosedive está disponível no catálogo da Netflix.

O Featurette Oficial de Black Mirror | S03E01 – Nosedive (Queda Livre) | 2016