Crítica: Dentro (Inside) | 2023

Nós não ficamos sabendo o nome de nosso protagonista até os créditos finais aparecerem neste Dentro (Inside, UK/ALE/BEL/SUI/GRE, 2023, 105 min.), primeiro longa de ficção do diretor grego Vasilis Katsoupis (My Friend Larry Gus). O nome dele é “Nemo”, talvez numa forma de conjurar um espírito de aventura; mas este Nemo não está viajando pelo fundo do mar ou em uma ilha; este Nemo está preso dentro de um pesadelo claustrofóbico, mais precisamente dentro de uma pretensiosa (e mortal?) cobertura. Lá, o amante das artes/ladrão será forçado a utilizar toda sua astúcia (e inestimáveis obras de arte) para sobreviver à armadilha na qual caiu.

Trata-se de uma interessante reviravolta nas histórias de sobrevivência — e se você estivesse preso dentro, e não fora? — onde a presença sempre inerentemente assistível do sensacional Willem Dafoe impulsiona a trama e segura o público, mesmo que a citada reviravolta e a performance de seu protagonista cheguem apenas até certo ponto. Inside logo transforma suas espertas perguntas em confusas respostas, terminando na nota mais estranha possível para um filme que teve início de maneira tão promissora.

Willem Dafoe em DENTRO (INSIDE) | 2023

Nemo nos diz que “A Arte é para sempre” através de uma narração que irá reaparecer mais tarde de maneira deveras diferente. Mesmo que o espectador venha a passar quase duas horas totalmente acompanhado da solitária compania do protagonista, isso é praticamente tudo o que saberemos sobre sua visão de mundo e filosofia. Nemo se auto proclama um homem de estética, mas ele é também um gatuno. Enquanto ele faz uma varredura em um luxuoso apartamento de Nova York à procura de quatro pinturas do pintor austríaco Egon Schiele, ele nem sequer toma um minuto para dar uma olhada em outros pinturas. Ele é um homem determinado a cumprir sua missão.

Mas quando Nemo insere o código de saída no tablet de segurança, o sistema dispara uma série de alarmes, luzes piscantes e uma voz mecânica que anuncia um “problema de sistema”. Um parceiro do outro lado do walkie-talkie vaza instantaneamente, deixando Nemo completamente sozinho. O barulho e as luzes já são ruins o suficiente, mas os verdadeiros problemas estão apenas começando: Não há água ou gás no apartamento, o sistema de ar-condicionado ou produz uma temperatura tão quente quanto o inferno ou tão fria quanto o Pólo Norte, e Nemo se encontra literalmente preso no local. E agora?

Com informações limitadas nas mãos, o espectador fixa sua atenção em pequenos acontecimentos, como Nemo se tornando obcecado por um pombo moribundo na sacada ou lambendo o interior do freezer para amenizar a sede. Mas logo começam a surgir as perguntas: Será que alguém tão rico como o dono da cobertura não teria uma equipe de segurança de prontidão para checar o alarme? Alguém não teria que passar no apartamento para alimentar aqueles peixes exóticos caros? Por que a despensa está trancada com cadeado? Por que Nemo desiste tão rápido de reparar o tablet? Algumas dessas respostas podem ter o sistema de alarme defeituoso como desculpa, mas muitas delas parecem ser produto do roteiro frouxo escrito por Ben Hopkins (de obras obscuras como Lost in Karastan e The Nine Lives of Tomas Katz).

Quando Nemo tenta ensaiar uma fuga, algumas de suas ideias são bastante inventivas. Ele fabrica um par de óculos para proteger seus olhos e descobre como fazer macarrão sem água quente, mas outras descobertas (como aquela em que ele simplesmente grita bem alto na esperança de ser resgatado) parecem mais o resultado de um roteiro fraco do que de um personagem burro. Ao longo do caminho, a fotografia de Steve Annis (A Cor que Caiu do Espaço) se torna essencial, e encontra verdadeira beleza nos mais simples dos detalhes, graças a close-ups como o suor pingando do pescoço do protagonista, ou uma excelente tomada de dentro do freezer onde Nemo está tentando saciar um pouco sua sede.

Nemo eventualmente desmorona — e quem em Hollywood é capaz de desmoronar melhor que Dafoe? — o que permite mais flexibilidade na forma que julgamos o problemático roteiro de Dentro. Longos trechos do filme se desenrolam sem que Nemo pronuncie uma só palavra, ainda que Hopkins encontre uma maneira esperta de fazer seu protagonista interagir com outros personagens, uma vez que ele se concentra em um único canal de TV: uma estação de circuito fechado que transmite imagens ao vivo dos arredores do edifício.

À medida que o tempo passa, as coisas não só ficam mais nojentas (o estado da cobertura, a figura cada vez mais esquálida de Nemo, o literal monte de merda em uma banheira que passa a ser usada como vaso sanitário), como se tornam totalmente miseráveis. Katsoupis e Hopkins utilizam a calamitosa situação para interrogar a possibilidade de uma conversão religiosa do ladrão arruinado, o que acaba sendo muito menos interessante do que as sutis observações que apareceram antes na trama.

Para um filme tão fixado na arte — arte cara, arte louca, arte séria — Dentro abandona seus questionamentos mais convincentes rápido demais. De que serve esta arte à face da real necessidade? No momento em que Nemo utiliza uma escultura de valor inestimável para tentar abrir uma porta, sua conversão parece óbvia; uma vez que ele pega outra e a transforma em uma tenda, a conversão é completa. Mas tudo é conduzido de maneira excessivamente brusca, sem sutileza nenhuma, o que diminui severamente o impacto reflexivo da obra como um todo. A verdadeira arte está interessada em levantar questionamentos; e não em respondê-los da maneira mais simples possível.

Avaliação: 2.5 de 5.

[UPDATE]: Dentro está disponível no catálogo do Prime Video.

O Trailer Oficial de DENTRO (INSIDE) | 2023

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