Crítica: Venus (2022)

O horror espanhol Venus (ESP/EUA, 2022, 100 min.), reúne um time de fazer inveja: A produção é de ninguém menos que Álex de la Iglesia (O Bar, O Dia da Besta, Perdita Durango), que recrutou o diretor especialista do gênero, Jaume Balagueró (franquia REC), para comandar a mais nova adição em sua série de filmes batizada de “The Fear Collection”, que já conta com o recente Encurralados em Veneza, dirigido pelo próprio Iglesia e cuja crítica você confere aqui mesmo no Filmes do Kacic). Balagueró por sua vez, se juntou ao roteirista Fernando Navarro (Verónica, A Musa) para co-escrever este Venus, uma moderna e sangrenta atualização do conto do mestre H.P. Lovecraft, “The Dreams in the Witch House” (Sonhos na Casa da Bruxa, na tradução livre). Curiosamente, o mesmo conto ganhou há pouco tempo uma versão dirigida por Catherine Hardwicke para a antologia de horror da Netflix, O Gabinete de Curiosidades (confira crítica aqui), projeto produzido por outro expoente do gênero, o genial Guillermo del Toro.

Aqui, entretanto, Iglesias, Balagueró e Navarro aplicam um viés mais moderno, utilizando uma pegada violenta de thriller criminal no conto de Lovecraft, o que cria uma esperta distração para que o horror cósmico invada a história discretamente. A dançarina Lucía (Ester Expósito, das séries Elite e Vis a Vis), abandona sua plataforma durante o horário de pico da casa noturna onde trabalha, com o objetivo de entrar escondida no escritório e roubar uma remessa de drogas de seu chefe corrupto. Ela consegue escapar do local (por pouco) com sua vida e o estoque roubado, sabendo que seu chefe e seus capangas não irão descansar enquanto não recuperarem a droga. Ela decide se esconder no único lugar onde eles não serão capazes de encontrá-la; junto de sua irmã, Rocío (Ángela Cremonte), com quem ela não fala há muito tempo, e sua sobrinha, Alba (Inés Fernández). A tensão entre as irmãs revela-se insuportável, e Rocío decide fugir do decrépito prédio de apartamentos onde vive, deixando Lucía sozinha com Alba em um local que vai se tornando cada vez mais estranho e perigoso.

Ester Expósito em VENUS (2022)

Balagueró mantém o dilema em torno do sangrento roubo cometido por Lucía sempre em primeiro plano, deixando como pano de fundo pequenas pistas de que algo muito errado está acontecendo no edifício Venus. A protagonista está presa lá não só por causa da perseguição da máfia, mas também pelo abandono de sua sobrinha, deixada pela mãe, já que Rocío não deixou nenhum indício de que irá retornar ao apartamento. Trata-se de uma maneira eficiente de prolongar as respostas dos mistérios mais proeminentes do prédio e escalar a tensão. Os constantes cortes para as táticas da máfia para encontrar Lucía adicionam um agoniante elemento de contagem regressiva na trama, uma vez que os homens se aproximam cada vez mais de Lucía, como uma corda apertando cada vez mais seu pescoço.

Venus mantém tudo tão firmemente enraizado no presente que mesmo Lucía é renderizada de maneira um tanto vaga. Apenas alguns detalhes são fornecidos sobre ela, apenas o suficiente para pintá-la como uma protagonista moralmente ambígua com um passado difícil. O relacionamento entre Lucía e Rocío não é desenvolvido o suficiente para que seus altos e baixos emocionais causem o impacto necessário, contudo, ambas as atrizes se comprometem aos papéis com enorme intensidade. Já a precocidade de Alba é mais cativante: a pequena, adorável e inteligente Inés Fernández fornece de maneira convincente um motivador plausível e emocional para sua tia Lucía ao longo do filme.

Bem ao estilo Lovecraft, o horror surge lentamente e vagamente na trama, pelo menos à princípio. Pesadelos atormentam Lucía à noite, enquanto que de dia, as reflexões proféticas de Alba sinalizam uma presença maior brincando com o destino dos residentes do edifício Venus. Quanto mais Lucía é forçada a permanecer dentro do prédio, mais o horror progride. Feridas sangram e pulsam, auto-mutilações e spray arterial escalam o terror do sutil ao grotesco. A rota de colisão entre a máfia e os inquilinos do Venus cria um explosivo, satisfatório e sangrento terceiro ato onde o gore corre solto.

O filme de Balagueró pode até ser derivado de um conhecido conto de Lovecraft, mas sua ênfase no aspecto criminal da trama coloca Venus mais perto de um thriller de suspense do que do terror cósmico. Sua mitologia e seus personagens poderiam ser melhor desenvolvidos, mas isso não impede o impacto de suas propulsivas sequências de ação ou momentos de gore. Expósito demonstra sua impetuosidade no gênero como uma heroína resiliente e determinada, especialmente no insano clímax da produção. No geral, Venus é um esperto híbrido de ação e horror que será muito mais lembrado por suas sequências empolgantes e brutais do que por seus calafrios cósmicos.

Avaliação: 3 de 5.

Venus não possui informação de lançamento oficial em território brasileiro, e deve ser disponibilizado no país em breve através de plataformas alternativas.

O Trailer Oficial de VENUS (2022)

Um comentário sobre “Crítica: Venus (2022)

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