Crítica: O Homem do Norte (The Northman) | 2022

Amolem as facas e preparem as piras de funeral: um furioso Viking está em uma jornada de sangrenta vingança neste O Homem do Norte (The Northman, EUA, 2022, 136 min.), e os cadáveres são empilhados cada vez mais alto neste alucinante épico de ação do badalado diretor e co-roteirista Robert Eggers (dos queridinhos da crítica (eu incluído) A Bruxa e O Farol).

Escrito em colaboração com o autor islandês Sjón (do recente Lamb e do cultuado Dançando no Escuro), O Homem do Norte é repleto de gore, lama e alucinações, além de ser intensamente divertido. Um estudo sobre a maneira com que a violência gera violência, e uma examinação de como uma vida dedicada à violência pode levar à verdades desconfortáveis, este é um filme que faz justiça a todas as sagas dos quadrinhos e bandas de heavy metal que surgiram da inspiração pela sociedade, pelo folclore e pelas conquistas do povo Viking.

Alexander Skarsgård e Anya Taylor-Joy em O HOMEM DO NORTE (THE NORTHMAN) | 2022

O filme tem início com o jovem Príncipe Amieth (Oscar Novak, do novo Batman), que corre para contar à sua mãe, a Rainha Gudrún (Nicole Kidman), sobre o retorno do Rei Aurvandil (Ethan Hawke), cuja chegada é celebrada com um banquete que inclui até gracejos do bobo da corte Heimir (Willem Dafoe). Aurvandil e Heimir logo iniciam o jovem Amieth em um ritual que permite a ele acessar seus instintos animais, mais precisamente de um lobo, e o timing não poderia ser mais apropriado: Aurvandil é assassinado pouco tempo depois, por seu próprio irmão, Fjölnir (Claes Bang, de The Square: A Arte da Discórdia), o que força o jovem príncipe a fugir em um barco, jurando matar Fjölnir e um dia resgatar Gudrún de suas garras.

Uma vez adulto, Amieth (agora interpretado por Alexander Skarsgård, colossal), usa seu poder de lobo como parte de um grupo de saqueadores que conquista uma vila e vende seus habitantes como escravos. Quando ele percebe que o mais resistente dos reféns será vendido para Fjölnir — agora um fazendeiro e líder de um culto — ele marca a si mesmo como um escravo e se junta a eles, ansioso para cumprir sua jornada de uma vida. Ao longo do caminho, ele se apaixona por Olga (Anya Taylor-Joy), e constata que colocar-se cara a cara com sua nêmesis (e reunir-se com sua amada mãe), será muito mais complicado do que Amieth poderia imaginar.

Eggers e seu habitual diretor de fotografia, Jarin Blaschke, agora completam uma trinca de filmes que se desdobram em ambientes naturais duros e implacáveis, que parecem desafiar a ocupação humana. Depois do banquete em honra de Aurvandil, não existe um momento sequer no filme em que alguém pareça aquecido, confortável ou suficientemente alimentado. Mas a brutalidade dos arredores alimenta a intensidade obsessiva de Amieth em sua busca. Praticamente todas as tomadas em O Homem do Norte são deslumbrantes, mas a fotografia de Blaschke, especialmente nas sequências noturnas, adiciona temor e inquietação à esta beleza, e vai de encontro ao intrincado e perturbador design de som à cargo de Steve Little (O que Ficou Para Trás) e sua equipe.

A editora Louise Ford, também colaboradora habitual de Eggers, sabe como criar momentos de grandeza (cenas de navegação onde o horizonte parece não ter fim; personagens marchando pelo épico cenário islandês), ao mesmo tempo em que fornece aos momentos de violência os apropriados choques e intensidade, desde o combate mano-a-mano até os ataques noturnos de Amieth ao complexo de Fjölnir. Há também uma sequência “atlética”, envolvendo uma partida um tanto extrema do bom e velho cricket (bem, ao menos uma versão Século 19 do esporte), que desperta um sádico interesse de como seria um filme esportivo dirigido por Eggers.

Assim como em seus dois filmes anteriores, Eggers sabe como levar seus atores à frequência especificamente estranha de suas histórias, e o elenco se compromete completamente ao habitar este mundo e transmitir as paixões e obsessões de seus personagens. Skarsgård é pura ferocidade em boa parte do filme, mas nunca há a sensação de uma postura indulgente; ele fornece um caminho para se compreender o que move Amieth, mesmo quando o personagem mergulha na ferocidade animalística. Assim como no filme de estreia de Eggers, os olhos grandes e o talento de Anya Taylor-Joy permitem à atriz transmitir com convicção a ideia de uma mulher com poderes no plano místico. Olga pode não ser páreo para a intimidação física de Amieth, mas ela compartilha de seu compromisso com a destruição de seu inimigo em comum.

Nicole Kidman raramente obtém o crédito que merece por se arriscar e procurar oportunidades de trabalhar com diretores ousados. Como a grande Catherine Deneuve, Kidman abraça as caracterizações excêntricas guiadas por cineastas que trabalham fora do mainstream, e a atriz quase sempre colhe os benefícios com indeléveis papéis coadjuvantes como este, que elevam sua reputação de performer imprevisível e cativante. Uma estrela que sempre some em seus personagens.

O Homem do Norte é o melhor tipo de filme multifacetado que existe. Sem abandonar suas credenciais artísticas, Eggers cria uma saga de ação extrema e incrivelmente dura, que tem o potencial de atrair o tipo de espectador que pode ter achado seus trabalhos anteriores impenetráveis. Trata-se de uma visão de futilidade e fúria, da colisão entre natureza e humanidade, onde a violência é tanto o meio quanto a consequência. É também uma antiga fantasia de vingança que discorre com terrível verdade sobre o momento em que vivemos atualmente, e sobre as lições históricas que nunca parecemos aprender.

Avaliação: 3 de 5.

O Homem do Norte estreia no dia 12 de maio nos cinemas brasileiros.

O Trailer Oficial de O HOMEM DO NORTE (THE NORTHMAN) | 2022

2 comentários sobre “Crítica: O Homem do Norte (The Northman) | 2022

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