Crítica: A Banquet (2021)

As tensões entre fé, família e medo do futuro se misturam em uma profana aliança neste A Banquet (UK, 2021, 97 min.), um calculista filme de estreia da diretora Ruth Paxton, que aproveita o roteiro do também estreante Justin Bull e uma boa dose de influências que vão de Stephen King a David Cronenberg e Lars Von Trier. Paxton molda tais referências em uma intensa combinação de pesadelo apocalíptico e psicodrama familiar, cuja natureza íntima e construção lenta remete a outros exemplares bem sucedidos da vertente, como os recentes The Feast (2021) e Saint Maud (2019).

Após o terrível suicídio de seu marido, Holly (Sienna Guillory, a Jill Valentine da franquia Resident Evil), precisa cuidar sozinha de suas filhas adolescentes, Betsey (Jessica Alexander, do vindouro live-action de A Pequena Sereia) e Isabelle (Ruby Stokes, do drama Una). Após o triste acontecimento, a luxuosa casa da família se tornou uma fortaleza e santuário. Poderia ser até uma tumba, ou uma anti-câmara para um outro plano além deste, tamanho o isolamento emocional destas três mulheres.

Sienna Guillory e Jessica Alexander em A BANQUET (2021)

Um dia, Betsey deixa a casa para tomar um ar fresco e é atraída em direção à floresta pelo brilho da lua de sangue, e nada mais será o mesmo após seu retorno. Convencida de que foi “escolhida” por um poder superior, Betsey simplesmente para de comer. Seu corpo não mais lhe pertence e ela não consegue mais digerir nem mesmo uma única ervilha. Uma ansiosa e cada vez mais desesperada Holly procura toda a ajuda médica e psiquiátrica imaginável, sem obter uma resposta satisfatória. “Provavelmente é uma virose”, diz um dos especialistas.

A lógica diz que Betsey deve estar sofrendo de algum distúrbio alimentar, e o filme amplifica esta sensação ao retratar a comida como um inimigo. Uma frigideira fritando banco cospe óleo e produz sons repugnantes; dentes rasgam um pedaço de frango úmido e molho espesso escorre da boca como sangue. Paxton utiliza close-ups extremos na comida para transmitir a sensação de que o que seria uma fonte de nutrição se transformou em algo nojento. Porém, o fato de que Betsey não parece estar perdendo peso leva Holly à reflexão; um diário é preenchido com colunas que mostram que o peso da adolescente continua exatamente o mesmo dia após dia.

A dinâmica familiar é um elemento chave em A Banquet. Trata-se de um trio de mulheres atingidas pelo luto, onde Betsey é claramente a filha favorita. Holly se encontra dividida entre salvá-la e querer acreditar nela, e então vovó June (a ótima Lindsay Duncan, de Birdman e Questão de Tempo) aparece para uma visita. Com sua persona austera, June mais parece uma vestimenta chique recém-lavada no meio da roupa suja. A velha não está para brincadeira, e ela logo procura combater as crenças de Betsey com o bom e velho raciocínio lógico, porém é ela quem acaba engrossando ainda mais o mistério, ao sugerir que o que está acontecendo é a história da família se repetindo.

Com sua abordagem cerebral ao invés de visceral, e pontuado por um rico subtexto sobre os laços entre mães e filhas, A Banquet propõe o dilema se Betsey está vivenciando as agonias de uma doença mental ou alguma forma de inexplicável êxtase. A temperatura emocional é determinada por performances comprometidas, especialmente de Guillory como a exasperada Holly, uma mulher cada vez mais próxima do desespero; e de Alexandra como Betsey, o fiel da balança do filme que curiosamente vai aos poucos encontrando um crescente senso de paz em meio ao caos ao redor. Onde reside a verdade em torno da condição de Betsey é vital para um filme composto de forma provocativa e rigorosa, que confirma Paxton como um talento singular a ser observado.

Avaliação: 2.5 de 5.

A Banquet percorreu o circuito de festivais como o TIFF e Fantastic Fest no segundo semestre de 2021, e será lançado em Digital e VOD no dia 18 de fevereiro.

O Trailer Oficial de A BANQUET (2021)

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